DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. DIGNIDADE HUMANA. FÉRIAS VENCIDAS A PARTIR DE DOIS PERÍODOS NÃO GOZADOS, PELOS SERVIDORES ABSORVIDOS POR FORÇA DE LEI COMPLEMENTAR DE EXTINÇÃO DO DAERP. CARACTERIZADO A INCÚRIA E DESMAZELO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA, QUE POR DISPLICÊNCIA OBSTA UM DIREITO IRRENUNICÁVEL DO SERVIDOR. MERECE RESPONSABILIZAÇÃO DA AUTORIDADE QUE OBSTOU. SE A MUNICIPALIDADE NÃO DEFINIU O PERÍODO DE GOZO E AGORA OBRIGA A RETIRÁ-LOS EM DESCANSO NUMA ÚNICA VEZ, AFRONTA O MAIS ELEMENTAR DIREITO À SAÚDE ALÉM DE SE LOCUPLETAR ÀS CUSTAS DO TRABALHO DO SERVIDOR. MIUNICIPALIDADE DEVE INDENIZAR O SERVIDOR, SOB PENA DE ENRIQUECIMENTO INJUSTIFICADO.
INTERESSADOS: SERVIDORES DO EXTINTO DAERP, HOJE SECRETARIA MUNICIPAL DE ÁGUA E ESGOTO (SAERP).
ASSUNTO: SERVIDORES ESTÃO SENDO OBRIGADOS PELA MUNICIPALIDADE A GOZAR SEGUIDAMENTE, POR MESES, EM DESCANSO, AS FÉRIAS QUE NÃO FORAM CONCEDIDAS TEMPOS ATRÁS.
Cuida a presente consulta formulada por servidores na ativa do extinto DAERP que estão sendo obrigados, por intimação pessoal através de memorandos internos, pela chefia, a gozarem períodos aquisitivos anteriores que não foram concedidas no momento oportuno.
Tal fato também vem acompanhado no memorando de fundamentação da chefia sob a alcunha de “solicitação de férias”, como se o pedido tivesse partido do servidor, como se houvesse um consentimento ou uma vontade pessoal. Inclusive se caracteriza má-fé.
Se trata de uma arbitrariedade e em completa violação aos mais elementares Princípios de Moralidade e Legalidade expressos no art. 37, “caput” da Constituição da República Federativa do Brasil e pelo § 6º do mesmo Artigo, o Municipalidade corre o risco de se ver obrigado a indenizar o servidor por perdas e danos, como se vê abaixo:
Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)
6ºAs pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.
Como leciona Hely Lopes Meirelles:
“A legalidade, como princípio de administração, significa que o administrador público está, em toda sua atividade funcional, sujeito aos mandamentos da lei e às exigências do bem comum, e deles não se pode afastar ou desviar, sob pena de praticar ato inválido e expor-se à responsabilidade disciplinar, civil e criminal, conforme o caso.” (MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 43ª Edição. São Paulo: Editora Malheiros, 2018).
No caso em apreço, a municipalidade deve comprovar que indeferiu os pedidos de fruição das férias dos servidores, por necessidade do serviço, mas não se tem como dar azo para que o extinto DAERP e hoje SAERP tenha indeferidos mais de dois períodos aquisitivos e isso é inaceitável.
Existe entendimento no STJ e no STF extraído da própria Constituição, o direito de o servidor exonerado/aposentado converter as férias não gozadas em pecúnia.
Também faz jus ao mesmo direito o servidor que exonerado do cargo efetivo, ou em comissão, e perceberá indenização relativa ao período das férias a que tiver direito, na proporção de um doze avos por mês de efetivo exercício, ou fração superior a quatorze dias.
Já no caso do servidor em plena atividade, que é o motivo do presente parecer, a jurisprudência predominante é que o direito ao gozo de férias do servidor deve-lhe ser garantido em no máximo dois períodos aquisitivos, somente se justificando a não concessão de férias em virtude da imperiosa necessidade do serviço.
Extrapolado esse período de dois períodos aquisitivos por interesse da Administração, a consequência lógica não é a extinção do direito às férias, caso contrário a Administração estaria violando os princípios de boa-fé que devem reger não apenas as relações entre particulares.
Estaria, dessa maneira, valendo-se de sua própria autoridade para privar o servidor de seu justo descanso, locupletando-se ilicitamente do trabalho desenvolvido em violação às normas de medicina do trabalho que determinam o descanso de qualquer trabalhador.
Ademais, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça sedimentou o entendimento de que tais parcelas, quando não gozadas por impedimento da Administração Pública, devem ser consideradas como indenização, presumindo-se o interesse do serviço.
Para tanto, considera-se, aqui, o fato de que o empregador, inegavelmente, beneficia-se do trabalho prestado pelo empregado em seu período de férias e que o não afastamento do empregado, por opção da administração, estabelece uma presunção a favor do servidor.
O Supremo Tribunal Federal tem o seguinte posicionamento:
“AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. ADMINISTRATIVO. CONVERSÃO DE FÉRIAS NÃO GOZADAS EM PECÚNIA. POSSIBILIDADE. MANDADO DE SEGURANÇA. NORMA INFRACONSTITUCIONAL. OFENSA INDIRETA. IMPOSSIBILIDADE EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO.
- A violação da Constituição do Brasil seria indireta, eis que imprescindível o reexame de matéria processual, nos termos da Lei n. 1.533/51 e do Código do Processo Civil.
- O Supremo Tribunal Federal fixou entendimento no sentido de ser possível a conversão de férias não gozadas em indenização pecuniária dada a responsabilidade objetiva desta e vedação ao enriquecimento ilícito. Precedentes. Agravo regimental a que se nega provimento.” (AI 768313 AgR, Relator(a): Min. EROS GRAU, Segunda Turma, julgado em 01/12/2009, DJe-237 DIVULG 17-12-2009 PUBLIC 18-12- 2009 EMENT VOL-02387-16 PP-03108 RT v. 99, n. 894, 2010, p. 132-134, LEXSTF v. 32, n. 373, 2010, p. 147-151)
Assevera, ainda, o STF o seguinte posicionamento pacífico:
“AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. DIREITO ADMINISTRATIVO. RECEBIMENTO DE INDENIZAÇÃO POR FÉRIAS VENCIDAS E NÃO GOZADAS POR NECESSIDADE DO SERVIÇO PÚBLICO. ALEGADA OFENSA AO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE. TRANSGRESSÃO AOS VERBETES Nº 269 E 271/STF. INOCORRÊNCIA. PRECEDENTES. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO.[…]
O fundamento de ofensa ao princípio da legalidade não encontra guarida, pois o estado recorrido não pode se valer do argumento de ausência de lei prevendo a conversão de férias não gozadas em pecúnia para eximir-se do pagamento do direito laboral constitucionalmente assegurado, sobretudo quando a fruição deste restou inviabilizada por estar o servidor em exercício de função pública indeclinável, a de juiz corregedor do Tribunal da respectiva unidade da federação. Essa proibição está encerrada no princípio geral de direito da vedação ao enriquecimento sem causa, aplicável inclusive à Administração Pública, conforme bem acentuado nos precedentes supracitados.
[…]
In casu, o acórdão impugnado mediante o extraordinário assentou: “CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. MAGISTRADO. FÉRIAS NÃO GOZADAS. MOTIVAÇÃO ALHEIA À VONTADE DO SERVIDOR. CONVERSÃO EM PECÚNIA IMPOSTO DE RENDA. NÃO INCIDÊNCIA. NATUREZA INDENIZATÓRIA. PAGAMENTO EM DOBRO. INDEVIDO. SEGURANÇA CONDECIDA EM PARTE. I. Férias vencidas e não devidamente gozadas por motivação alheia à vontade do servidor gera direito á sua conversão em pecúnia. II. Não incide imposto de renda sobre as verbas de natureza indenizatória. III. Pagamento em dobro das férias não usufruídas é vantagem assegurada somente aos celetistas. IV. Segurança parcialmente concedida.” 6. Agravo Regimental a que se nega provimento. (RE-AgR 636661, LUIZ FUX, STF)”
Logo, o servidor do extinto DAERP e hoje SAERP, tem o mesmo direito que um magistrado, qualquer outro servidor da esfera Federal, Estadual ou Municipal e, mesmo que não haja Lei Municipal que lhe garante a conversão desses períodos aquisitivos não gozados em pecúnia, tal direito se encontra amparado pela Jurisprudência do STF que tem repercussão geral sobre a questão.
No caso em apreço, vê-se que a Administração Pública se utiliza no memorando de que o pedido partiu do servidor, e se não foi o servidor que requisitou, inclusive obriga a Administração Pública a indenizar o servidor em Danos Morais, pela má fé e de utilização de subterfúgios para eximir-se do pagamento do direito laboral constitucionalmente assegurado, sobretudo quando a fruição deste restou inviabilizada por estar o servidor em exercício de função pública indeclinável.
Assim, o Servidor do SAERP tem direito à conversão das férias vencidas em pecúnia., que é o mesmo em dinheiro ou em espécie monetária, além dos danos morais.
Caso a Administração Pública não indenize o servidor que se encontra na ativa, no seu direito à pecúnia, resta a busca do Poder Judiciário para a busca do direito.
Qualquer servidor pode fazer a consulta do seu direito se utilizando do WhatsApp do escritório. E os servidores que já são clientes do escritório, podem também se utilizar do seguinte e-mail: vladimir@poletoadvocacia.com
Esse é o Parecer sobre o direito do servidor do extinto DAERP, esteja ele na ativa ou se aposentando, ou ainda se foi exonerado do seu cargo em comissão que detinha no extinto DAERP e que tinham também períodos aquisitivos a seu favor e que não foram contemplados no prazo legal.
O escritório se colocará a postos e se utilizará de todos os meios legais para que esse direito seja garantido na via judicial àqueles que fizeram a presente consulta e àqueles que desconheciam ainda seu direito.
VLADIMIR POLETO
OAB/SP 322.079